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Cidade dos 
Direitos Humanos

Nuremberg encara a sua história e quer ser um modelo de engajamento e de humanidade.

18.03.2013
© picture-alliance/dpa

Nuremberg agradou a Evelyn Konrád. O Castelo Imperial, a velha cultura, “isto, naturalmente, nos falta nos EUA”. Mas, ressalta ela, o que a impressionou de forma especial é “que Nuremberg levante uma forte voz pelos direitos humanos”. Disso ela não sabia, afirma, e irá divulgar tal fato nos EUA. Este episódio, que comoveu recentemente em Nuremberg, vale a pena de ser narrado por um motivo determinado: Evelyn Konrád tem 84 anos de idade e esta foi a sua primeira visita a Nuremberg, em janeiro de 2013, desde que deixou a cidade, com três anos de idade. Teve de deixar. De 1930 até 1932, seu pai, Jenö Konrád, foi treinador do então glorioso time de futebol do 1º FC Nürnberg. E ele era judeu, o que fez com que o panfleto antissemita “Der Stürmer” difamasse da pior forma possível o ex-jogador da seleção húngara. Konrád decidiu ir embora. Com a esposa Grete e a filha Evelyn, ele emigrou para os EUA, onde abriu uma loja de cortinas. O panfleto, agora amarelado, está exposto hoje no pequeno museu do clube de futebol.

Entrementes, Adolf Hitler fizera de Nuremberg a cidade das convenções do partido nazista. Por esta razão, Nuremberg é mais associada com o nazismo que outras cidades. E, por isto, Nuremberg se esforça mais e de forma mais explícita que outras cidades pela superação de seu passado. Nuremberg quer ser uma cidade da paz e dos direitos humanos. A primeira frase da diretriz aprovada em 2001 pela segunda maior cidade de Baviera afirma: “Nós nos comprometemos, em razão da especial responsabilidade histórica de Nuremberg, a uma ativa realização dos direitos humanos”.

Nuremberg é marcada por sua responsabilidade histórica. Também visualmente. Os restos da megalomania de Hitler ainda podem ser vistos. Na antiga aérea de convenções do partido nazista, projetada por Albert Speer, está a tribuna do Campo de Zeppelin, de onde ele entusiasmava as multidões. No Pavilhão de Congressos – a ruína nunca concluída, que deixa transparecer o cenário monstruoso que deveria ser um dia –, está sediado há onze anos o Centro de Documentação da área de convenções do partido nazista. Ele já foi visitado entretanto por mais de um milhão de pessoas. Em Nuremberg, sempre se discutiu se seria correto preservar as ruínas nazistas, em vez de deixá-las simplesmente à mercê da destruição do tempo. Foram necessários 75 milhões de euros para a restauração apenas da tribuna no Campo de Zeppelin. “São lugares-chave da história do século 20”, afirma Hans-Christian Täubrich, o diretor do Centro de Documentação. Por isto, não há dúvida para ele de que as construções devem ser preservadas. São recebidas muitas cartas, especialmente do exterior, cujos remetentes reivindicam exatamente isto, afirma ele.

As convenções do partido nazista e as Leis de Nuremberg, com as quais Hitler cimentou juridicamente em 1935 a perseguição e a discriminação dos judeus e que Täubrich classifica como o verdadeiro rompimento com a civilização, transformaram Nuremberg num “lugar de criminosos”, segundo o prefeito da cidade, Ulrich Maly. Isto é reconhecido em Nuremberg. Mas da história também fazem parte os processos de Nuremberg de 1945 e 1946, que fizeram da cidade um marco do direito penal internacional. A sala 600 do Palácio de Justiça, na qual foram condenados os próceres nazistas, é ainda hoje uma sala de tribunal. As paredes são recobertas com os painéis escuros de antes, mas o mobiliário foi trocado. Uma parte do banco de réus original está hoje na mansarda do Palácio de Justiça, onde foi inaugurado em novembro de 2012 o Memorial dos Processos de Nuremberg. A exposição informa sobre os processos e sua herança que se estende até à Corte Penal Internacional de Haia. Atualmente, está sendo criada a “Academia Internacional dos Princípios de Nuremberg (AIPN)”, que pretende desenvolver os “princípios de Nuremberg”, surgidos em consequência dos processos, como fundamentos do direito internacional.

No gabinete de Martina Mittenhuber, a diretora da Secretaria dos Direitos Humanos de Nuremberg, chegamos finalmente ao centro dos trabalhos de direitos humanos da cidade. Na parede está pendurado um certificado da UNESCO, concedido no ano 2000, pela “Human Rights Education”, pela educação para os direitos humanos. “Nuremberg logrou transformar uma difícil herança histórica numa missão positiva para o futuro”, afirma a historiadora formada e explica porque Nuremberg é a única cidade na Alemanha a dispor de uma secretaria de direitos humanos. Isto teve início em 1995, com o Prêmio de Direitos Humanos, que a cidade concede, desde então, a cada dois anos. Ele deveria ser um símbolo de que nunca mais deverão partir de Nuremberg outros sinais que não sejam de paz. Mas também uma proteção para os premiados, que se veem ameaçados em razão do seu engajamento. O primeiro prêmio foi concedido em 1995 ao russo Sergej Kowaljow pela sua ação contra a guerra na Tchetchênia. Em 2013, será agraciado Kasha Jacqueline Nabagesera, da Uganda, pela sua luta contra a homofobia.

“Ficou logo claro na época, que o trabalho pelos direitos humanos teria de ser realizado não apenas externa, mas também internamente”, afirma Martina Mittenhuber. Surgiu assim a Secretaria dos Direitos Humanos. Sua atuação interna significa, por exemplo, que os funcionários do município têm de ser instruídos sobre direitos humanos. “Desejamos criar um certo posicionamento, o de tratar todas as pessoas com respeito”. Por isto, Nuremberg criou, também como única cidade, uma Repartição de Antidiscriminação, uma iniciativa da Secretaria dos Direitos Humanos. Martina Mittenhuber e seus cinco funcionários tratam das questões de refugiados, engajam-se contra o extremismo de direita, elaboram diretrizes para empresas construtoras de moradias ou formulam princípios de ética para a assistência a idosos e inválidos. “Nós levamos o trabalho pelos direitos humanos até à sociedade civil”, afirma ela. “Esta é uma situação de vanguarda na Alemanha”. O trabalho pelos direitos humanos não apenas é realizado na cidade, ele também é visível. São as quase 70 árvores Ginkgo espalhadas por Nuremberg, cada qual simbolizando um artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos. E quem deseja visitar o Museu Nacional Germânico, dirige-se à entrada principal, passando pela Rua dos Direitos Humanos, uma obra do artista israelense Dani Karavan. Colunas brancas de concreto margeiam o caminho, em cada uma delas está gravado um artigo da Declaração, em alemão e numa segunda língua. “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”, pode ser lido na primeira coluna. Em iídiche.

Isto foi lido também por Evelyn Konrád e ela ficou muito comovida. Não disse qualquer palavra negativa sobre esta cidade, da qual quase não tem recordações pessoais. Seus pais foram muito felizes aqui, afirma ela. Até que foram banidos. Mas banidos não é a palavra correta, diz ela. “Foram as vozes dos nazistas, não as vozes da cidade”. ▪