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“A beleza e a estranheza”

O romance “Brennendes Licht” (“Luz Ardente”) conta sobre o exílio mexicano da escritora Anna Seghers. Uma entrevista com o autor Volker Weidermann.

Interview: Helen Sibum, 30.11.2020
Autor e crítico literário Volker Weidermann
Autor e crítico literário Volker Weidermann © dpa

Quando Anna Seghers deixou a Europa em 1941, fugindo dos nazistas, ela queria ir na verdade para Nova York com sua família. Mas as autoridades de imigração os recusaram no porto de Ellis Island, eles então continuaram sua viagem para o México. Até 1947 a escritora comunista (“A sétima cruz”, “Em Trânsito”) viveu lá, mais tarde ela foi para a RDA. Volker Weidermann, autor e crítico literário da revista “Der Spiegel”, escreveu um livro sobre seu tempo no exílio: “Brennendes Licht - Anna Seghers in Mexiko” (“Luz Ardente – Anna Seghers no México”).

Sr. Weidermann, o senhor pôde fazer pesquisas para seu livro em localidades do México?

Sim, mas como é frequentemente, a literatura só deixa rastros em nós, os leitores. No mundo, eles não são mais tão visíveis. Pelo menos pude ver o pequeno apartamento onde Anna Seghers morava depois de sua chegada. Isto me fez lembrar novamente como ela era pobre e perdida no início de seu tempo no México. Mais tarde, após o grande sucesso de seu romance “A sétima cruz”, ela se mudou para uma casa tipo bangalô, que eu também pude visitar. Mas no final, tudo tem a ver com a luz, o azul, a beleza – e também com a experiência de estranheza.

Por que o país permaneceu tão estranho para ela?

Ela não falava espanhol até o final e também ela simplesmente não queria ir para lá. Mas o México tinha uma política muito liberal de imigração naquela época. Durante um certo tempo, o país foi um porto de salvação para muitos refugiados políticos. Sobre isso, Pablo Neruda disse a bela frase: “Aqui se reuniu o sal da terra”.

A arte de Diego Rivera era um ideal absoluto para Anna Seghers.
Volker Weidermann, autor

Pelo menos, Anna Seghers teve contato com o pintor mexicano Diego Rivera.

A arte de Diego Rivera foi para ela um ideal absoluto, o núcleo de sua experiência no México. Reescrever o mundo para pessoas analfabetas, reescrever o passado, reescrever o futuro: este tipo de historiografia política e de estórias, arte e arte popular era para ela um paraíso. Ao mesmo tempo, ela admirava Rivera como uma pessoa destemida e não oportunista. Para ela, este era o México – um ideal de humanidade política e de arte política.

Supõe-se que ela também conhecia sua esposa Frida Kahlo – hoje muito mais proeminente como artista –, mas isso não pode ser comprovado?

Claro, ela percebeu Frida Kahlo à distância, mas ao contrário da arte de Diego Rivera, seu trabalho deve ter sido profundamente estranho para Seghers. Esta auto exposição, transformando sua própria dor em arte – isso foi o oposto de Anna Seghers. Ela deve ter fugido de Frida Kahlo em pânico, ainda que ambas fossem comunistas, ainda que ambas tenham sofrido graves lesões físicas devido a acidentes de trânsito no México.

Sabe-se mais sobre os contatos de Anna Seghers com o povo mexicano?

Eles eram muito limitados, simplesmente porque ela não dominava a língua. Ela escreveu um conto sobre a vida da sua empregada; esta mulher foi provavelmente seu contato principal.

Isso foi também devido à falta de interesse?

Não sabemos ao certo. Anna Seghers também tinha muito o que fazer – como esposa de um homem pouco prático, mãe de dois filhos jovens e com toda esta situação de vida no exílio. Ela teve que manter a família unida, escreveu romances e paralelamente organizou saraus para o Heinrich Heine Club.

Esse clube pode ser visto certamente como uma forma de intercâmbio cultural.

Embora o Heine Club tenha sido inicialmente uma autoconfirmação, ele também serviu para levar a cultura alemã ao México. Eram noites abertas do clube, mesmo que os mexicanos não viessem certamente em massa. O pensamento esperançoso era: “Vocês nos acolheram e, em troca, trazemos a vocês nossos romances, nossa cultura”.

Tudo do que hoje nos orgulhamos na literatura, na arte, na música, é uma cultura de refugiados.
Volker Weidermann, autor
Anna Seghers
Anna Seghers © dpa

Como surgiu o seu livro sobre Anna Seghers?

Isto está relacionado, entre outras coisas, ao livro que escrevi antes, sobre Marcel Reich-Ranicki e Günter Grass. Em Reich-Ranicki, o desejo de se tornar um crítico literário foi despertado através da leitura de “A sétima cruz”. Ele considerou que, havendo livros de tal força política e moral, então ele só poderia ocupar-se com a literatura. Günter Grass, por outro lado, sentiu-se encorajado por sua leitura do livro a escrever uma carta aberta a Anna Seghers após a construção do Muro de Berlim. Ele não conseguia conceber que alguém que escreveu “A sétima cruz” pudesse ficar calado sobre a construção do Muro.

Anna Seghers como pessoa com muitas contradições.

Sim, há um certo dilema moral ou uma dicotomia não muito conclusiva da pessoa entre seus conhecimentos literários e fazer as coisas politicamente de maneira diferente. “A sétima cruz” trata do poder do indivíduo contra a preponderância de um regime político totalitário. Mas na realidade política, Anna Seghers repetidamente capitulou a esta preponderância e fez compromissos incríveis. A Aufbau Verlag – a editora de Anna Seghers desde o início – queria, por isso, um livro sobre ela, que fosse honesto e mostrasse suas contradições.

A história de Anna Seghers é também uma história atemporal de fuga e migração?

É sempre importante para mim deixar claro que nossa cultura – tudo aquilo de que hoje nos orgulhamos na literatura, na arte, na música – é uma cultura de refugiados e que nada disso existiria se não houvesse países em todo o mundo que acolheram essas pessoas. Esta é a base sobre a qual nos apoiamos. Hoje, cada vez mais pessoas estão em fuga e sua situação está se tornando cada vez mais dramática. Quanto maiores os movimentos de fuga, maior a construção de muro, maior o temor dos que têm posses. Com obras literárias pode-se ao menos lembrar que muitos de nossos antepassados também viveram temerosos e desesperados neste mundo.

Só que os movimentos de fuga hoje são diferentes e é mais provável que o México seja antes ponto de partida para a migração.

Sim, mas tudo isso não foi há muito tempo e pode ser muito bem, que tudo esteja rolando novamente.