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Smart Factory

Num modesto galpão em Kaiserslautern, cientistas montaram uma “fábrica do futuro”.

13.01.2014
© Tim Wegner - Detlef Zühlke

Lá, dentro da fábrica, Detlef Zühlke não se parece, na verdade, com um revolucionário. O professor catedrático está usando um paletó e óculos sem aro. Sua mão esquerda está brincando com uma peça de Lego. Em volta dele, estão dependurados muitos cabos e tubos que parecem tão novos e estéreis, como se estivessem prontos para ser usados. De certa maneira, isto é verdade. Eles pertencem ao modelo de uma fábrica do futuro, que Zühlke construiu aqui, no Centro 
Alemão de Pesquisa de Inteligência Artificial, em Kaiserslautern. A ideia da “Smart Factory” é um elemento essencial da quarta revolução industrial.

A história da fábrica do futuro em Kaiserslautern começou com uma viagem de trem. Zühlke estava voltando para casa. Em Duisburg, ele tinha visitado um modelo de prédio da Sociedade Fraunhofer – uma casa residencial com soluções especiais para a economia de energia e com aparelhos que pensam. Ainda sob as impressões desse longo dia, Zühlke pensava naquela “Smart Home”, dirigindo também seus pensamentos numa outra direção. Aquilo que era possível para uma casa não poderia funcionar também na produção? E isto através da interconexão digital de aparelhos para aperfeiçoar as operações, segundo o desejo individual do morador, ou mesmo do cliente? “Havia a necessidade de um protótipo”, pensou o cientista. Ele guardou essa ideia na cabeça durante algumas semanas, até que resolveu saber a opinião dos representantes da indústria.

A resposta que ele obteve pode ser mostrada na instalação em Kaiserslautern. Em todos os lugares se encontram componentes de firmas que hoje pertencem à “Smart Factory”. O começo foi difícil, apesar do apoio da economia. Até mesmo os visionários tiveram que se conformar com a burocracia, o que Zühlke e seus colaboradores experimentaram, quando refletiram sobre qual produto poderia ser fabricado na fase de teste. “Deveria ser fácil, uma brincadeira para entusiasmar as pessoas”. Fabricantes de bolachas e de bebida alcoólica também ofereceram sua ajuda. Mas por causa das rigorosas exigências em relação aos gêneros alimentícios, a solução do problema foi o sabonete.

Três recipientes de líquido estão dependurados sobre a linha de produção, como se fossem bolsas de infusão. Os tubos enchem com sabonete líquido os frascos de plástico conduzidos pela linha de produção. Até aí, nada de espetacular. Mas a diferença entre a “Smart Factory” e uma fábrica qualquer está no rótulo quadrado colado no lado de trás dos frascos de plástico – um chip de computador. Os empregados falam de “memória de produção”. “O produto traz consigo o conhecimento e diz à máquina, como ele deve ser”, explica o Dr. Matthias Loskyll, vice-diretor científico da “Smart Factory”. Os frascos de plástico são enchidos com sabonete azul, vermelho ou amarelo? Talvez uma mistura? E, se for o caso, em que proporção? A tampinha deverá ser preta, branca ou cinzenta? O que estará escrito no 
rótulo? Essa fábrica de sabonete parece ser simples, mas as variedades daquilo que ela produz são infinitas.

Este é o ideal da “Smart Factory”: flexibilidade total, o mais rápido possível. “Temos que reproduzir melhor o mundo que está em rápida transformação”, diz Zühlke. Segundo sua visão, o cliente faz a encomenda do produto pela internet e, logo após, começa a fabricação de acordo com seus desejos particulares, sem que a linha de produção tenha de ser modificada. Todavia, se a troca de máquinas for necessária, então, por favor, usando o princípio “Plug & Play”, onde tudo é compatível entre si. Uma fábrica tem que ser desmontada e remontada numa nova forma, como se faz com um monte de peças de Lego. Para demonstrar isto com maior clareza, Zühlke e seus empregados desenvolveram uma outra linha de produção, apresentando-a em 2013 na Feira de Hanôver. Ela produz minilanternas com uma gravação pessoal, mas pode também fabricar “localizadores de chave”, ou seja, um chaveiro que emite sinais ao smart­phone do proprietário. Toda máquina que participa da produção pode ser retirada e reposta em segundos. Cada um dos elementos possui um computador próprio e minúsculo, em vez de estar sob um comando central.

Isso é menos futurístico do que parece. Numa mesa, ali perto, existe uma placa com o letreiro “Lugar de trabalho manual”. Isto significa que o trabalho manual é necessário na fábrica do futuro? “Com toda certeza! É precisamente na indústria automobilística que ainda continuarão existindo tarefas que têm que ser feitas à mão”, diz Matthias Loskyll. Mas, no futuro, o trabalho manual e o treinamento deverão ser feitos “inteligentemente”. O 
lugar de trabalho à mão “Handarbeitsplatz 4.0” combina o objeto real com modelos tridimensionais. “Augmented Reality” é a palavra mágica, ou seja, a realidade aumentada ou ampliada. De cima, um globo ocular observa a mesa. A imagem aparece num monitor. O empregado vê suas próprias mãos, ocupadas com uma montagem de pequenos componentes. Na parte superior da tela, animações mostram o que ele tem que fazer, passo a passo.

O homem não deve ser expulso da “Smart Factory”, diz Detlef Zühlke. E, de nenhuma maneira, ele deverá ser usado apenas para fazer o trabalho manual restante. “Trata-se de alcançar maior flexibilidade. E o homem é o elemento mais flexível de todo o sistema. Ele será o solucionador de problemas, estará andando pela fábrica e observando que tudo funcione”. Mas, para tanto, seria necessária uma outra formação. Zühlke é a favor de que se rompam as barreiras inflexíveis entre as profissões e as disciplinas científicas. Ele próprio estudou Eletrotécnica, mas se doutorou no campo da Engenharia Mecânica. “Um dia, eu cheguei à conclusão de que o que fazemos aqui não tem sentido sem a Informática”. Atualmente, ele é o diretor da cátedra de Automatização da Produção na Technische Universität (TU) de Kaiserslautern. Uma formação profissional nos moldes do Lego, que é também o princípio da “Smart Factory”.

A ampla fachada do galpão, no qual a fábrica se encontra, é de vidro. Zühlke planejou essa instalação de tal maneira que ela é iluminada durante a noite, sendo assim uma “janela” para os estudantes da próxima TU, que passam por lá quando voltam para a cidade. O cientista quer atrair as atenções. A falta de jovens cientistas que estejam preparados para a Indústria 4.0 é, na sua opinião, uma das três razões, porque a “Smart Factory” ainda não tenha se tornado realidade. O segundo motivo é a falta de padrões. As peças de Lego combinam entre si sem problema, pois todas elas são provenientes do mesmo fabricante. Mas este não é o caso das máquinas. As operações do processo têm que ser “independentes do fabricante” – mais uma expressão que frequentemente se ouve na “Smart Factory”. A terceira razão é a segurança. Até que ponto este novo mundo industrial é vulnerável? Como se pode proteger um sistema baseado na transparência e no intercâmbio? 
Como se pode assegurar a privacidade de dados, se os chips de computadores escrevem um diário sobre tudo o que acontece com um produto?

“Suponho que vamos encontrar uma solução”, diz Zühlke. “Não temos outra escolha”. Zühlke está convicto de que a Indústria 4.0 seria a única chance da Alemanha de se impor economicamente. Ainda teríamos um pouco de tempo a caminho da 
fábrica do futuro, mas o interesse internacional é grande. Zühlke viaja muito, pois é sempre convidado a relatar o que está acontecendo naquele discreto galpão em 
Kaiserslautern. O interesse vem de todas as partes do mundo. Só “a Europa ainda não se manifestou”. Os interessados são, sobretudo, os países asiáticos. A Coreia, por exemplo, tem semelhante projeto tecnológico. Os EUA, ao contrário, apostam antes numa ampla reindustrialização do que em estratégias pontuais de alta tecnologia.

Zühlke tem 64 anos. No começo de 2015, ele se aposentará. Ele prevê que apenas em três anos haverá elementos maiores da “Smart Factory” na indústria real e, talvez em dez anos, uma fábrica completa. Ele gostaria de estar presente quando isso se tornasse realidade, pois, de qualquer maneira, quer permanecer unido ao projeto. “Seria muito triste ter lutado tanto, ter enfiado a mão no óleo do motor e, de repente, ter que abandonar tudo”. ▪