Romper o círculo vicioso da crise
Controlar os balanços, minimizar os riscos: com a união bancária, a Europa enfrenta a crise financeira e do endívidamento.
Cinco anos após a eclosão da crise financeira no outono de 2008, a Europa ainda enfrenta dificuldades. A crise é tão persistente, porque os problemas dos bancos e do Estado estão estreitamente ligados. No apogeu da crise do euro, pôde-se observar um círculo vicioso: os bancos afetados foram amparados com recursos públicos, fazendo com que aumentasse o nível de dívida dos países em crise. Isto inspirou a desconfiança dos mercados financeiros e levou à queda de cotação das obrigações estatais, sobrecarregando por sua vez os balanços dos bancos. Assim, a crise financeira tornou-se cada vez mais profunda, até que Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE), apaziguou os mercados com a sua promessa de julho de 2012, de salvar o euro a qualquer preço. Mas ficou claro também que o anunciado programa de compra das obrigações eliminou somente alguns sintomas da crise.
Os políticos e a direção do Banco Central admitem entretanto que a Europa demorou na busca de uma solução para a crise bancária. O mercado não confia nos bancos, que encobrem grande número de empréstimos falidos nos seus balanços. Segundo uma pesquisa atual da consultoria Ernst & Young, a cota dos empréstimos que não serão pagos ou não serão pagos dentro do prazo estipulado atingiu o valor recorde de 7,8 % – um total de 940 bilhões de euros. A maior parte dos créditos de cobrança duvidosa é a dos bancos da Espanha (12 %) e da Itália (11,5 %). A menor cota é a da Alemanha (3,2 %). Muitos bancos em crise praticamente não podem mais conceder créditos.
Agora, a Europa iniciou um projeto de grande depuração: a “união bancária”. Ela também deverá apoiar a abalada união monetária europeia. “Uma união monetária necessita da união bancária – mesmo porque um setor bancário estável é complemento indispensável para uma moeda sólida”, esclarece o diretor do BCE, Yves Mersch, de Luxemburgo. A nova arquitetura financeira deverá ter três pilares: primeiro, uma fiscalização conjunta dos bancos; segundo, um sistema padronizado de liquidação dos bancos debilitados e, em terceiro lugar, uma garantia de investimentos em toda a União Europeia. Luta-se enfaticamente por cada um desses três elementos. Existe forte resistência contra uma garantia conjunta dos investimentos. O mais adiantado são os preparativos para a fiscalização bancária conjunta. E também o mecanismo de resolução das crises foi decidido pelos chefes de Estado e de governo no final do ano.
Uma arquitetura estável da união bancária, esta é a esperança da politica, deverá eliminar os pontos fracos da união monetária. Em primeiro lugar, deverá tratar-se de localizar sobrecargas antigas do setor financeiro. Bancos fracos têm então de ser recapitalizados, bancos sem perspectivas deverão ser fechados. O primeiro passo para isto é uma ampla revisão dos balanços de 128 grandes bancos através do BCE, que começou em novembro de 2013. Sabine Lautenschläger, vice-presidente do Banco Central Alemão e diretora designada do BCE, ressalta a importância da revisão dos balanços: “Com isto, queremos principalmente criar transparência e descobrir possíveis sobrecargas antigas”. Somente assim se poderá reforçar novamente a confiança e eliminar “a suspeita geral de balanços bancários ruinosos, que existe atualmente”.
O processo é composto de várias fases: inicialmente, são identificadas carteiras de risco em cada banco. Na Espanha, por exemplo, podem ser os créditos imobiliários; na Alemanha, muitos créditos navais duvidosos constam dos balanços de alguns bancos estaduais e do Commerzbank. Em seguida, os fiscais do BCE examinarão os itens quanto ao seu valor real. Além disto, a Autoridade Bancária Europeia (EBA) realizará em 2014 um teste de estresse. Será simulada então uma crise econômica com perdas para os bancos. Após o teste, os bancos têm de apresentar suficiente reserva de segurança: uma sólida cota de capital principal de, no mínimo, 8 %, Isto é mais que o fixado no futuro regulamento Basileia III, aprovado pelo G20. Em outubro de 2014, serão divulgados os resultados dos testes.
Para algumas instituições bancárias podem surgir problemas. Se houver lacunas de capital, os bancos deverão buscar o capital necessário através de investidores. Os ministros de Finanças da UE aprovaram as responsabilidades de futuros salvamentos de bancos: primeiro, deverão ser mobilizados proprietários e credores do banco, bem como os donos de grandes contas com saldo maior que 100 000 euros – uma mobilização de investidores, em vez de contribuintes. Depois disto, o Estado tem de ajudar as casas bancárias abaladas. Yves Mersch, o diretor do BCE, ressalta: “A união bancária não é uma união de transferências, por trás do pano. Cada um tem de eliminar a sua própria sobrecarga antiga”. Os regulamentos “bail in” devem ser aplicados nas futuras crises dos bancos. Porém, eles só vigoram a partir de 2016, ou seja, um ano após iniciada a fiscalização dos bancos.
No BCE existe preocupação de que os recursos privados e nacionais não sejam suficientes para uma recapitalização dos bancos. Por isto, o Banco Central gostaria de ver implantada uma rede europeia de segurança. O Mecanismo de Estabilidade do Euro (MEE) poderia fornecer os recursos. No entanto, isto suscitaria, sobretudo na Alemanha, novas preocupações de uma socialização europeia dos problemas dos bancos.
Uma dissensão divide a Europa nesta questão: nos países sul-europeus especialmente atingidos pela crise, como a Espanha e a Itália, mas também na França, muitos desejam que a recapitalização seja financiada por fundo europeu, como o MEE. Na Alemanha, a hipótese gerou o protesto de muitos economistas. Os partidos tradicionais ainda sentem, além disto, o choque pelo fato de a “Alternativa para a Alemanha”, partido crítico do euro, quase ter logrado ingressar no Bundestag no pleito de 2013. Segundo as resoluções dos chefes de Estado e de governo da UE no final de 2013 – a Alemanha logrou impor reivindicações centrais, mas também fez concessões –, a UE assumirá paulatinamente os fundos nacionais de salvamento. Após dez anos, o volume de recursos para fechamento de bancos em crise deve ser de 55 bilhões de euros. Muitos economistas duvidam que tal soma seja suficiente para uma grande crise bancária. ▪