Mitos e realidades
O conceituado pesquisador de opinião Manfred Güllner diz como devem ser classificados realmente os “êxitos eleitorais” dos populistas de direita da AfD.
Se o noticiário de muitos órgãos da mídia na Alemanha correspondesse à realidade dos fatos eleitorais, então o país estaria num “terremoto” permanente. Um órgão conceituado como “Der Spiegel” publica regularmente que o resultado de uma eleição “abala” a República, “transforma a Alemanha” ou “abre as portas para uma nova era política”. E mais: a AfD não descrita não apenas pelos próprios líderes da AfD, mas também por “Der Spiegel” como “novo partido popular”.
Porém, até mesmo pelos dados numéricos, a AfD está longe de ser um “partido popular”. No total dos seis Estados, nos quais foram realizadas em 2018/19 eleições estaduais ou municipais, apenas um décimo do eleitorado votou na AfD. A grande maioria de quase 90 % não quis e não quer nenhum envolvimento com a AfD e votou num outro partido ou simplesmente não votou.
Até mesmo nas regiões alemãs orientais, onde a AfD é mais forte – Brandemburgo, Turíngia e Saxônia – 86 %, 85 % e 82 % do eleitorado, respectivamente, não deram a ela o seu voto. Além disso, não se pode falar de maneira alguma de um “crescimento constante” da AfD. Em todas as seis eleições de 2018/19, ela obteve menos votos que na eleição para o Bundestag, há dois anos. Na soma dos seis Estados, o número de eleitores de “direita” caiu em cerca de 440.000, de 2,7 milhões na eleição do Bundestag para 2,26 milhões nas eleições de 2018/19.
A AfD tampouco é – como os verdadeiros partidos populares tradicionais – apoiada por amplas camadas da população. Ela é uma agremiação homogênea conspirativa, sustentada sobretudo por homens, que agrupa o potencial latente, ainda existente na Alemanha do pós-guerra, daqueles que são suscetíveis ao ideário populista.
Ao contrário do teor dos noticiários, os “velhos partidos” também puderam mobilizar mais eleitores nas eleições estaduais, em comparação à última eleição para o Bundestag, através de representantes populares e acessíveis para os cidadãos. Assim, a CDU logrou 30.000 votos a mais na Saxônia com Michael Kretschmer; o SPD, 69.000 votos a mais em Brandemburgo com Dietmar Woidke; e o partido A Esquerda na Turíngia, com Bodo Ramelow, quase 126.000 votos a mais que em setembro de 2017.
Lá, onde os governadores estaduais eram extremamente malquistos – como Sieling em Bremen – ou ainda estavam à sombra dos seus antecessores, também malquistos – como Söder na Baviera, os partidos SPD, CDU e CSU foram castigados nas eleições e perderam grande número de eleitores centro-liberais para Os Verdes. O mesmo vale para o na verdade liberal Bouffier em Hesse que, como herdeiro de Roland Koch, assumiu um partido considerado muito direitista pela população.
A propósito, a perda drástica de confiança e de importância dos antigos partidos populares, União e SPD, teve início muito mais cedo, antes da existência da AfD. Na década de 1970 e no início da década de 1980, a CDU, CSU e o SPD tiveram temporariamente os votos de quase 80 % do eleitorado, mas sua cota caiu, já na eleição de 2009 para o Bundestag, para menos de 40 %.
Através da perda de força vinculativa pela União e o SPD, o “partido dos abstencionistas” tornou-se cada vez maior, que se compõe em grande parte dos insatisfeitos políticos e sociais de centro. Mas esse grande grupo de insatisfeitos, que não quer de forma alguma votar em radicais, não recebe a consideração, que na verdade merece, no noticiário dos órgãos da mídia.
O professor Dr. Manfred Güllner é sociólogo, psicólogo social e administrador de empresas. Em 1984, ele fundou o Instituto Forsa e fez dele um dos principais institutos alemães de pesquisa de opinião.
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