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Prazer e 
consciência

Como muda o gosto na Alemanha e o mundo dos restaurantes se transforma.

09.09.2013
picture-alliance/dpa - German cuisine
picture-alliance/dpa - German cuisine © picture-alliance/dpa - German cuisine

As modas e tendências da nova cozinha alemã

Cozido de legumes, couve, chucrute, bolinhos de batata. No Natal, um ganso cozido no forno durante horas. Esta é a tradicional cozinha alemã. Assim era ela ontem – e ainda é assim hoje, frequentemente. Muitos a adoram, mas não todos. Existe na Alemanha um grupo de consumidores, principalmente jovens, marcado pelas experiências e influências internacionais, que gosta de sushi e curry tailandês, tanto quanto de escalope. Existem gêneros alimentícios baratos, mas há também uma alta consciência de qualidade, que combina com um novo e profundo gosto pelo campo e pela vida rural. E existem dois temas que sempre surgem em todo debate sobre comida e bebida na Alemanha: a ética do consumo e a reconscientização sobre o valor dos produtos regionais. Também os “chefs de cuisine” participam disto.

Lavagante, tamarindo & tomate, trufa australiana, palmito, castanha d’água: excertos do cardápio do restaurante de Tim Raue, em Berlim. Filé de salvelino, sauté de batata e cantarelo, caldo de cebolinha: isto está no cardápio do restaurante de Harald Rüssel, num vale lateral do Mosela. Ambos os restaurantes são comandados por cozinheiros altamente premiados. Harald Rüssel tem 18 pontos no guia de restaurantes Gault Millau e uma estrela do Michelin há 20 anos. Tim Raue tem três estrelas desde 2002. Para conhecer os dois restaurantes é preciso atravessar toda a Alemanha. Eles estão separados por 700 quilômetros de distância, mas isto não é tudo. Nas suas respectivas filosofias, são inteiramente diversos, eles formam algo como os lados opostos nas tendências permanentes da gastronomia de ponta: para um, o mundo é seu mercado de compras; para o outro, o mercado é o próprio país.

Cerca de 60 % dos alemães concordam, em princípio, em comer menos carne. Isto foi citado recentemente por um cientista agrário da Universidade de Hohenheim, após entrevistar cerca de 2000 homens e mulheres sobre seus hábitos alimentares. O consumo de carne diminui à medida em que aumenta o grau de instrução e a renda pessoal, afirmam outros cientistas e constatam uma mudança de imagem: enquanto a carne era, no pós-guerra, um produto de luxo, ela é hoje um produto de massa. E consumi-la é, cada vez mais, prova de que se faz parte das classes sociais mais baixas. Esta é uma tese ousada, que só pode ser comprovada de maneira insuficiente através de números, mas que indica uma nova tendência. “Eu sou um flexitário” – o neologismo descreve pessoas, que não se alimentam inteiramente sem carne, mas que são flexíveis no seu consumo de carne. Frequentemente, sua abstinência tem motivação política: para eles, comer menos carne significa dar uma contribuição contra a utilização das áreas agrícolas para a produção de ração animal, o que impede que sejam plantados nelas mais legumes e frutas. “Less but better”, menos, porém melhor carne: os produtores deveriam agir segundo este lema no futuro, na opinião dos cientistas agrários de Hohenheim. Os consumidores já sabem, há muito, desse caminho. Isto é demonstrado, há anos, por uma demanda crescente de pratos vegetarianos em todo tipo de restaurante.

O debate não apenas sobre o sabor, mas também sobre a qualidade ética dos gêneros alimentícios, já chegou entretanto ao setor da gastronomia. Continuam existindo os clientes, que desejam comer os clássicos produtos de luxo num restaurante de alta classe. Mas existem também cozinheiros, que querem convencer seus clientes de que, em vez de um rodovalho, um bagre autóctone também pode ter um sabor fantástico. Outros não temem incluir, no meio do cardápio, um prato composto apenas de couve-flor crua. O cozinheiro com a couve-flor é Matthias Schmidt, de 32 anos, que trabalha no restaurante Villa Merton, em Frankfurt do Meno. Ele tem uma concepção radical, com a qual já chamou muito a atenção e recebeu por ela, até mesmo, uma segunda estrela do Michelin. Schmidt trabalha com peixes do Meno e com trutas do Taunus, em vez de lavagantes e vieiras. Em vez de caros legumes exóticos importados, ele utiliza brotos de abeto, frutos de faia e ervas de nomes esquecidos, como a “Gundermann”. Os pratos são arranjados em expressivo estilo moderno, em contradição com os ingredientes tradicionais, com os quais ele compõe seus novos pratos. “Quero oferecer uma requintada cozinha regional”, afirma Schmidt, e diz que as mercadorias que utiliza vêm de um raio máximo de 250 quilômetros do seu restaurante. Muito antes dele, Harald Rüssel, alguns anos mais velho, começou a trabalhar de maneira muito semelhante no restaurante Landhaus St. Urban, em Naurath. Rüssel, que teve formação tradicional, é hoje um dos principais representantes da nova cozinha regional alemã de alto nível e na sua forma mais purista. Como entusiástico caçador, ele próprio abate os animais para a carne de caça; algumas ervas, ele mesmo as colhe no seu próprio jardim.

O panorama culinário alemão, em seu todo, mostra uma imagem diversa. Há pessoas que nunca comem carne, assim como pessoas, que o fazem todos os dias. Há supermercados baratos, com latas empilhadas de forma desleixada, e também os mercados de produtos orgânicos, onde as maçãs e as cabeças de repolho parecem preciosos objetos de exposição. Na Europa, os alemães continuam entre os povos que gastam muito pouco dinheiro com 
comida e bebida. Ao mesmo tempo, estudos comprovam que o prazer e a qualidade se tornam cada vez mais importantes. E, desde o passado recente, predomina a discussão sobre o verdadeiro valor dos gêneros alimentícios. Nisto, uma das vozes mais altas é a de Sarah Wiener, de Berlim. Ela se tornou conhecida como cozinheira, através de programas de televisão. Em entrevistas, ela fala sobre as vantagens dos produtos orgânicos e também que os pais deveriam incentivar os filhos a cozinhar. E quando não está ocupada com tudo isto, ela vai para o campo e faz regularmente estágio numa fazenda, limpa currais, ajuda na colheita. Muitos cozinheiros admiram isto. Alguns dizem que também gostariam de fazer o mesmo – se não tivessem de cozinhar.